O que a fome na Faixa de Gaza de 2025 deixa para a história

Publicamos a baixo texto produzido pela Rede Samidoun, uma rede internacional de organizadores e ativistas que trabalha para construir solidariedade com os prisioneiros palestinos em sua luta por liberdade. Neste artigo, os companheiros também convocam a “Ação contra a fome em Gaza”, que ocorrerá no dia 27/07, às 11h na Esquina da Av. Paulista com a Rua Augusta em São Paulo.

A faixa de Gaza, um território que antes de 2023 nunca tinha presenciado a fome, esta a beira da cova. Segundo relatório da IPC (International Food Security Phase Classification) de 12 de Maio de 2025, todos os 2.1 milhões de residentes de Gaza estão no nível 3 de “Insegurança alimentar”; ou seja, repetida experiência de fome física dentre pelo meno 1 adultos do domicílio. Dentre esses, 925,000 estão no nível 4, em que todos os adultos da residência convivem regularmente com a experiência de fome física, e dentre as crianças do domicílio, essas passam a não possuir ingesta calórica suficiente para garantir o crescimento. Além disso, 244,000, 12% da população total, já se encontram na fase 5, no qual a ingesta calórica de todos os membros, independente de idade, é insuficiente para impedir a desenvolvimento de doenças e a morte no curto prazo.

Cabe aqui ressaltar, dentre os vários crimes contra a infância cometidos pela entidade sionista, as escolas bombardeadas, as chuvas de fosforo branco, as terras contaminadas com munições de urânio D-38, o cerco comercial total imposto sobre Gaza por Israel desde 2 de março de 2025. Os preços de insumos aumentam 1,400% em um mês; mesmo assim os mercados se esvaziam. 20% das crianças de 6 a 59 meses de idade do território vivam em desnutrição aguda. Isto é, sem conseguir ingerir quantidades adequadas de carboidratos, proteínas, minerais e vitaminas para sustentar as funções corporais. Deve-se salientar que no histórico do holocausto Palestino que já dura 20 meses, as crianças de Gaza vivem não só a desnutrição cronica, como também a insegurança alimentar cronica; entre 2 ou 4 meses de experiência de fome física a cada ano, recorrentemente.

Poderíamos enumerar aqui diversas classificações estatísticas cada vez mais complexas, porém como transmitir através de dados a sensação da exaustão física da fome? O esgotamento de passar o dia vagando por ruas com odor fétido (Não é esgoto) buscando por um único quilograma de farinha, cozido em 8 míseros pãezinhos para os próximos 4 dias, como foi relatado pela jornalista Shaimaa Eid escrevendo de Gaza para o Palestine Chronicle.

E enquanto isso, nossas riquezas naturais, as jazidas de petróleo, as minas de ferro, crómio e níquel, nosso patrimônio e propriedade indisputável das massas que constroem as nações, desviado do seu uso social para financiar a matança dos povos irmãos. No Brasil, as remessas de petróleo bruto pela estatal PetroBras cresceram 44,000% entre 2023 e 2025. Alias os antigos empregadores do Sr. Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Villares Metals S/A, exportam aço diretamente para a Israeli Weapons Industries (IWI) e Israeli Military Industries (IMI) essa ultima uma subsidiaria da Elbit Systems. Apesar de sua forte militância nessa empresa durante o tempo em que era da diretoria do Sindicatos dos Metalúrgicos do ABC Paulista, esse tem adotado uma postura no mínimo dúbia sobre o rompimento desses laços comerciais com o estado colonial genocida.

Uma analise superficial pode indicar que fome vivenciada em Gaza nunca aconteceu antes em tamanha escala na história moderna. Porém, o que se sucede na Palestina é uma repetição trágica do que foi aplicado em outros países e territórios por um sistema colonialista que consome o mundo há 500 anos. A título de ilustração, quem se recorda do Timor-Leste? Colonia portuguesa, cedido a Austrália (outra colônia de assentamento) em 1941, e conquistado pelo império japonês em 1941, ocupação essa que matou 70,000 pessoas, 14,5% da população na época. 9 dias após sua independência de Portugal em 1975, foi invadido pela indonésia com apoio estadunidense. A segunda ocupação de longos 24 anos matou aproximadamente 1/3 das pessoas do território, contando com o aumento populacional. Hoje, a altura media dos homens de Timor-Leste é de 160,13 cm e das mulheres de 152,71 cm, devido ao crescimento atrofiado resultado da fome prolongada e deliberada no país durante essas décadas.

E… apesar desse passado sombrio, o povo timorense sobreviveu. O Timor-Leste é um dos países mais linguisticamente diversos do mundo, com cerca de 26 línguas faladas diariamente. Entre rituais animistas, a arquitetura colonial das catedrais, e as lendas diversas sobre a fauna local, dezenas de culturas interagem dialeticamente. O estado inclusive celebra 2 dias de independência, um de Portugal em 1975 e outro da Indonésia, em 2002.

Vamos camaradas, larguemos essas ilusões de “Solução Final”. As ocupações da Palestina – Romana, Britânica e Israelense – vão e vem, o povo palestino permanece. Os planos de Israel são delirantes, sua capacidade de executar a ocupação almejada esta colapsando, e com o aprofundamento do genocídio o regime esta caindo em uma completa dependência aos Estados Unidos. De fato Israel ira tentar alvejar, ferir e matar de fome quantos Palestinos puderem por quanto tempo seja possível. E fracassarão. Mas a lição que a fome de Gaza de 2025 deixa para a história é por quanto tempo deixemos que nossos governos permitissem que essas fantasias coloniais perdurassem.

O custo humano está sendo imenso, mas longe de serem fantasmas de um povo esquecido, cada morto será canto de memória para homens e mulheres ainda por nascer. Como escreveu a grande poeta Palestina Fadwa Tuqan:

“Lutamos com nossos olhos, semeamos com nossas mãos, veremos o trigo encher o vale.”


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